sexta-feira, 12 de agosto de 2011

O Tabernáculo


Certa vez alguns rapazes da mocidade combinaram de subir o Monte Crista. Aguardamos ansiosamente até o grande dia. Preparamos nossas mochilas e, pelas primeiras horas da manhã, com o intento de desfrutar melhor o dia, iniciamos a subida, cada um com a sua própria carga nas costas. Nas primeiras horas, tudo parecia-nos fantástico e lindo. A beleza da mata virgem enchia tanto os olhos que não nos importávamos por carregar tão pesadas mochilas. Na medida em que a trilha ia ficando mais estreita e íngreme, as forças pareciam se esvair junto de nosso suor. Não suportávamos mais carregar aquelas mochilas tão pesadas, machucando os ombros, mas tínhamos que levá-las, pois ali estava todo o nosso suprimento e as barracas. Depois de seis mortíferas e longas horas, chegamos ao cume do Monte Crista e, enfim, pude largar ao chão as mochilas. No mesmo instante quase fui dar com o rosto em terra, pois me desequilibrei, tão leve que sentia meu corpo após me livrar de tão pesado fardo. Já havia me acostumado com o peso e, por alguns instantes me senti flutuando sobre o solo,numa estranha sensação de que parecia faltar algum pedaço de mim. Naquele instante olhei à minha volta e vi que estava acima do nível das nuvens.
Sensação como esta pudemos, todos nós jovens, integrantes do Conjunto Nova Aliança, experimentar no Retiro realizado no Recanto Ararat. Não subimos montanha alguma, não carregamos mochilas por horas a fio; mas nos livramos de fardos pesados que carregávamos a muito tempo em nossas almas, e pudemos sentir a estranha sensação de flutuar em meio às nuvens durante toda aquela noite.
Quando chegamos, na tarde de sábado, mal podíamos imaginar, nem mesmo a liderança, tudo o que se passaria ali, naquele lugar, que naquela noite foi o nosso tabernáculo.
Ao despencar de uma árvore junto a entrada do recanto, foi-se a energia elétrica do lugar, mas não o bom animo de nossos jovens que, à luz de velas e ao som de um violão, começaram a cantar hinos de adoração ao Senhor. Eu poderia passar assim a noite inteira, mas Deus tinha nos reservado prazeres mui grandes, maiores mesmo que cantar louvores pela madrugada.
A energia voltou, e pudemos iniciar então a Vigília da Palavra. O intuito seria recebermos uma palestra sobre os elementos que constituíam o Tabernáculo do AT.
Quando se olhava para o Tabernáculo, a primeira coisa que se notava era o Altar do Holocausto. Era um altar de bronze que ficava do lado de fora do Tabernáculo. Ali eram oferecidos sacrifícios à Deus. Através do sacrifício haveria reconciliação com Deus, “pois todos pecaram, e estão destituídos da gloria de Deus”(Rm 3. 23)
Para nós, Cristãos, seguidores fiéis de Jesus Cristo, não existe sacrifício maior que o realizado por ELE na Cruz do Calvário. E através do sacrifício vicário e expiatório de Jesus por nós, podemos reconciliar-mo-nos com Deus. Mas para se obter livre acesso até Deus, se faz necessário passar pela Cruz, e se purificar no sangue de Jesus. Foi-nos preparada do lado de fora do salão, uma mesa. Um a um, todos, inclusive os líderes e os presbíteros que conosco estavam, retiraram-se por um momento até aquela mesa, e ali deveríamos escrever num papel, todos os nossos pecados. Acredito que cada jovem tenha passado no mínimo 15 minutos cada um, para realmente se concentrar e olhar para dentro de si mesmo, e expor à Deus as suas dificuldades e iniqüidades naquele pedaço de papel. Iniciamos às 20:00 da noite e terminamos às 1:30 da manhã do dia seguinte.
Foi algo inédito para mim, nunca vivi algo semelhante. Enquanto não chegava a minha vez de se retirar e escrever as minhas falhas, eu me sentia como um condenado prestes à se apresentar diante do Juiz, convicto de que minha sentença seria terrível. Mas, quando chegou a minha vez, eu me sentei na cadeira e comecei a chorar. Soluçava como uma criança. Fiz então uma oração ao Senhor, dizendo: “Deus, com minhas palavras, sei que não posso me justificar. Não há justificativas para o meu pecado. Só posso clamar pela tua graça e tua misericórdia. Sou miserável e nojento pecador, mas eu preciso de ti. Preciso do teu sangue, como um carrapato, que necessita de sangue para sobreviver. Por mais miserável que eu seja, me perdoe.”
Comecei então a escrever meus erros naquela folha, tudo o que já havia cometido contra Deus e os meus semelhantes. Dobrei a folha e carreguei-a junto ao meu corpo, envergonhado, sabendo que expusera ali naquela folha, outrora branca, agora manchada com a tinta escura que desenhava o meu pecado, as deficiências de meu caráter. Como um judeu, levando o cordeiro do sacrifício até o Altar do Holocausto, humilhado, pois todos viam o seu pecado, mediante seu sacrifício.
No meio tempo em que aguardávamos que todos fossem escrever seus pecados, o Espírito Santo começou a agir em nosso meio e tomou alguns jovens com ousadia e coragem para orar em alta voz perante todos, expondo ao grupo as suas dificuldades. Foi algo tremendo. Nem o mais duro pode conter as lagrimas. Em seguida, fomos conduzidos ao lado de fora, onde havia sido erguida uma cruz de madeira diante de uma grande fogueira. Sem efeito ritualístico, mas num ato simbólico, queimamos nossos “pecados” diante da Cruz, e pudemos nos abraçar.
Foi ali que senti o fardo sendo retirado de sobre meus ombros. Pude abraçar pessoas com as quais já não tinha mais comunhão, e me senti simplesmente leve. Este foi apenas o primeiro utensílio do Tabernáculo, o Altar. Havia muito mais pela frente.
Ao retornarmos ao salão, fizemos um circulo de mãos dadas, e foi passado em frente a cada um de nós um espelho de aproximadamente um metro de altura por trinta centímetros de diâmetro. Deveríamos olhar a nossa imagem refletida no espelho, depois de já haver passado pela Cruz; semelhante ao sacerdote, quando este se lavava na Pia de bronze, para se purificar da sujeira da poeira do deserto. O fundo da pia de bronze era espelhado, para que o sacerdote pudesse se enxergar.
Foi estranho ver minha imagem refletida depois de ter lavado a minha alma ao passar pela Cruz. Estranho, porque geralmente nós não podemos nos enxergar como realmente somos, mas as outras pessoas sim. E não raramente, as pessoas têm uma visão muito precipitada de nós, por conhecerem somente o estereótipo. Mas ali, diante do espelho, pude me enxergar como realmente sou. Todos calaram neste momento de auto-descoberta.
Depois passamos pela mesa dos pães, ah e este momento foi muito aguardado, pois estávamos famintos. A Mesa dos Pães era uma mesa de madeira que ficava no Lugar Santo do Tabernáculo. O Pão da Proposição ficava sobre ela. Eram doze pedaços de pães cozidos, um para cada tribo de Israel. Ficavam postos um de frente para o outro em dois montões, seis de cada lado. Deveria simbolizar a comunhão entre o Povo e o alimento espiritual oferecido por Deus. Sentamo-nos doze em cada mesa, seis de cada lado, um de frente para o outro e cada um deveria servir ao colega da frente, sendo este, depois o que lhe serviria. Teria sido uma experiência maravilhosa, não fosse o fato de que a salsicha estava EXTREMAMENTE SALGADA, e que a maioria comeu apenas o pão. Sendo assim, literalmente, pusemos naquela noite partilhar do Pão. E dele somente!
Refeitos de nossas necessidades fisiológicas, fomos conduzidos ao playground, onde instalaram e acenderam um antigo e enorme candelabro. Um Candelabro de ouro era situado no Lugar Santo, onde queimavam sete lâmpadas à óleo, e servia para iluminar o caminho para os sacerdotes. Da mesma forma, a Palavra do Senhor ilumina nossos passos, de maneira a nos conduzir mediante a graça redentora de Jesus Cristo até Deus, o Santo dos Santos. Munidos desta verdade, cada um, simbolicamente acendeu uma vela, tornando-se portador da Luz, como Cristo nos disse: “Vós sois a Luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte;” (Mt 5.14)
Será possível esconder uma cidade no topo de uma montanha? Certamente que não. À noite, sua luz pode ser vista há quilômetros de distancia.
Quando vivemos para Cristo. Brilhamos como luzes e mostramos ao mundo como Cristo realmente é. Deus nos faz como um farol brilhando em meio as trevas.
Depois nos dirigimos à casa dos donos do recanto, onde havia um lençol sobre a porta da entrada. Frente ao lençol havia uma mesa que, simbolicamente representaria o Altar do Incenso.
No Tabernáculo o Altar do Incenso ficava em frente ao véu. Era utilizado para queimar o incenso especial de Deus e era também um símbolo de aceitação da oração. A fumaça do incenso subiu para além do véu, chegando até a Arca da Aliança, representando o próprio Deus. Desta maneira, quando o sacerdote adentrava anualmente no Santo dos Santos, ele não poderia olhar diretamente para a Arca, pois esta estaria envolta pela fumaça do incenso. Da mesma forma nossas orações deveriam chegar até Deus e Ele as receberia para que pudéssemos chegar à sua Santíssima Presença.
Foi o momento mais emocionante da Vigília.
Formamos um grande círculo ao ar livre. Cada um de nós, um por vez, foi até o centro do círculo para que o restante pudesse orar por aquela pessoa e pela sua necessidade. Cada um pediu por alguém que estivesse afastado dos caminhos do Senhor, ou por alguma dificuldade que não estivesse conseguindo vencer. Muitos naquele momento abriram seu coração e expuseram problemas que nenhum de nós imaginaria que o outro estivesse vivendo. Alguns que não tinham mais forças para permanecer na presença de Deus, pediram ajuda; outros, que não estavam mais tendo um bom relacionamento com os pais; uma jovem revelou ao grupo estar doente e pediu por sua saúde; outros pediam para que Deus restaurasse o seu coração e pediam para que Ele lhes dessa força para superar traumas vividos no passado. Não houve quem não se derramasse ali naquele círculo.
O mais incrível é que a despeito do horário já avançado, pois já era quase 5:00 da manhã, e apesar do frio, da péssima refeição que tivemos e do fato de que depois teríamos de dormir no chão, ninguém queria para de orar. Não queríamos parar. Estávamos todos ali, unidos, sem mascaras, sem fardos, sem culpas, queimando pelo poder derramado naquele lugar pelo Espírito Santo. Sem perceber, já estávamos no Santo dos Santos, na Santa presença do Pai. Naquele instante Deus curou o corpo e a alma de todos os que necessitavam, e abriram os corações. Havíamos confessado nossas falhas uns aos outros, e se reconciliado com pessoas com as quais não tínhamos um bom relacionamento. Meu corpo tremia tanto, e meus olhos pareciam se derreter nas minhas lágrimas, pois houve um momento em que já não via mais ninguém, e pude sentir o olhar do meu Deus me atravessando a alma.
Entramos dentro da casa e alguns se ajoelharam imediatamente, outros não puderam contiveram e falavam em línguas estranhas. Muitos foram renovados e quem não era batizado, Deus batizou. Foi a experiência em grupo mais maravilhosa que jamais vivi em toda a minha vida.
Diante DELE, fizemos a única coisa que poderíamos fazer, em êxtase começamos a louvar hinos que engrandeciam o nome DELE.
Nunca imaginei que “passar pelo Tabernáculo” fosse mudar a minha vida de tal forma. Ainda hoje, passados vários dias, sinto-me diferente. O melhor de tudo foi saber que Deus está sim acessível. Não através de rituais, mas pela entrega total de nossas almas que lhe dispensamos naquela noite. Tivemos a oportunidade de amadurecer espiritualmente e compreender um pouco mais da Natureza do nosso Deus e da perfeição do Caminho que nos conduz ao Santíssimo.







Um comentário:

  1. Cara que experiência incrível, estava viajando aqui nas ondas do Espírito enquanto lia seu post. Lembrando a cada instante das reuniões e retirou da minha igreja.
    Fico feliz quando encontro alguém que de verdade e forma intensa conhece, experimentou, vive, serve a Deus, ja que nos dias de hoje infelizmente a maioria das igrejas, são só centros de encontros socias.
    Mas que Deus te abençoe muito, que o Espírito Santo continue fazendo na sua vida.

    ResponderExcluir